Fernando Aguirre
Embora pareça simples e seja uma expressão um tanto desgastada, as alianças estratégicas são, na minha opinião, de longe, o maior desafio real para a "Empresa do Futuro". É aqui que ocorre o efetivo desdobramento dos fatos, daquilo que pode corroer ou corroborar uma estratégia. Sem relacionamentos duradouros e frutíferos, nenhuma organização conseguirá se transformar o suficiente para oferecer aos seus clientes qualidade de atendimento, produtos e serviços que estes esperam. E isto vai além de um acordo comercial, pois exige um modelo de operação renovado, inclusivo, com negócios compartilhados e governança específica, distinta daquela que hoje cada organização possui individualmente.
Exemplos que podemos citar e que talvez o/a estimulem a pensar em alianças estratégicas: Como você garante o preço desejado no ponto de venda? Como você garante a correta exposição de seu produto? Como você consegue oferecer o melhor diferencial de serviços para os seus clientes? Como você consegue atender a capilaridade do nosso território nacional com custo logístico compatível? Como você consegue alocar capital para investir em negócios que os seus concorrentes também estão investindo, sabendo que, talvez, em breve, todos estarão nivelados e sem diferencial sustentável?
Fazer alianças nesse nível exige abstenção de comportamentos e modelos já arraigados e escritos na famosa estratégia "entre 4 paredes" para uma estratégia de relacionamento dentro do ecossistema de negócios em que a empresa desejar se inserir. Não preciso aqui repetir o que isto significa - veja nossos artigos anteriores. Os maiores desafios para as alianças serem bem sucedidas são:
- Interesses conflitantes: fabricantes, distribuidores, varejistas, concorrentes, fornecedores e clientes não se veem colaborando e fortalecendo as suas relações de negócios. Isso precisa mudar! É necessária a construção de uma estratégica conjunta, ainda que gradativa, visando entregar valor diferenciado e sustentável para os clientes. Sozinho(s), muito difícil, consome tempo e recursos e aumenta o risco. Em conjunto, riscos divididos, fortalecimento de todos e o cliente sai ganhando!
- Disputa pela mesma margem: essas mesmas empresas brigam pelo mesmo bolso do cliente. Há solução para isso? É possível fazer o cliente pagar mais? Se sim, melhor, mas, se não, importante conversar e entender onde cada participante agrega, o que ele produz, o que ele entrega, o que ele apoia, assim como suas dores e dificuldades. Aqui há uma mensagem factual: qualquer empresa que não possua um diferencial e uma função clara no seu segmento não irá sobreviver. Hoje observo que não existem movimentos maiores estruturados para configurar alianças, e sim o contrário - diversos segmentos com empresas "sofrendo" conjuntamente, com margens baixas e evitando as conversas tidas como difíceis.
- Disputa pelo mesmo mercado: da mesma forma existe a disputa pelo mesmo cliente, no mesmo mercado. Não estou aqui referindo-me a produtos concorrentes diretos, mas sim a produtos distintos para clientes comuns, onde poderia haver muita colaboração, com compartilhamento de custos e investimentos para, por exemplo, a construção de uma plataforma conjunta de negócios, ou mesmo um negócio baseado em e-commerce com infraestrutura compartilhada.
- Miopia estratégica: esse item remete diretamente ao não entendimento pleno sobre o que deve ser o mercado futuro e onde "A Empresa do Futuro" precisa estar. O clássico exemplo é o da indústria brasileira, que precisa encontrar com urgência um caminho para atender às necessidades do novo consumidor. Os seus custos estão altíssimos, as rupturas por conta da Covid-19 só cresceram, os riscos aumentaram e sozinho é praticamente impossível garantir nível de serviço. Tentar resolver tudo isso sozinho, com uma estratégia particular que seja vencedora, é a receita do fracasso. A resposta está em uma orquestração da equipe.
Agir em rede tornará os seus membros mais fortes. Os limites da estratégia empresarial precisam migrar para além dos limites de operação do seu negócio. Isso trará muitos benefícios, permitindo o fortalecimento das relações comerciais com seus parceiros de negócios, uma abertura maior para a troca de informações a respeito de estoques disponíveis, localidades, pedidos de clientes, preços, reduzindo os riscos na cadeia de suprimentos, atendendo ao cliente de forma ágil e com complementariedade das expertises.
Existe ainda muito receio quanto ao risco do uso indevido de informações estratégicas ou mesmo, em um modelo de plataforma de negócios, sobre a melhor forma de exposição da marca individual. Isso tudo é curva de aprendizado, onde não existe uma resposta pronta para as empresas que não surgiram já digitais, afinal, ninguém quer commoditizar a sua própria marca.
Posso garantir que não pensar desta forma será muito pior - o tempo irá dizer. Nosso trabalho tem sido apoiar, através dos workshops de "A Empresa do Futuro", uma discussão aberta com os diferentes participantes dos diversos segmentos de mercado, facilitando um diálogo que, sozinhos, não estamos vendo acontecer.
Fernando Aguirre é sócio de Mercados Regionais da KPMG no Brasil.
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