O que você imagina quando ouve a palavra tecnologia? Como a maioria das pessoas, provavelmente vêm à sua mente aparelhos eletrônicos, computadores e chips, certo? Mas há um certo tipo de tecnologia que vem trazendo novas soluções para antigos problemas coletivos rurais e urbanos e que não necessariamente tem a ver com o mundo high tech: a tecnologia social.
Como o nome já sugere, esse tipo especial de tecnologia busca solução em escala para problemas sociais. Pode ser um produto, um método, uma técnica ou um processo que seja desenvolvido junto às comunidades - aliás, a interação com elas na busca de soluções é imprescindível.
Esse conjunto de técnicas inovadoras merece nosso olhar aprofundado, principalmente em um país como nosso - tão amplo e diverso - onde não existem soluções únicas. Foi-se o tempo em que se acreditava que trabalho social era receita de bolo, afinal, a experiência há muito vem mostrando que não há respostas-padrão únicas para comunidades distintas. O que funciona em um lugar, pode ser um absoluto desperdício de recursos e tempo em outro.
Isto acontece porque cada grupo comunitário é formado por um conjunto único de características, que o tornam singular. O principal elemento diferenciador talvez seja o aspecto cultural, entre eles os hábitos arraigados entre a comunidade. Por exemplo: crenças populares podem facilitar ou dificultar a adoção de uma nova prática, por mais simples que seja, como o uso do vaso sanitário dentro de casa.
As características geográficas também não podem ser subestimadas: qual o tipo de clima ou solo do local, por exemplo? De nada adianta um belo projeto de construção de horta comunitária que não considera o desafio das regas em um clima seco ou de um solo já previamente exaurido. Parece tão óbvio, mas inúmeros foram - e ainda são, infelizmente - os equívocos na busca do desenvolvimento.
Tudo isso reflete diretamente na forma de solucionar problemas locais. O envolvimento de líderes comunitários e das famílias é o que permite que as soluções encontradas sejam não só as mais adequadas, mas também que sejam entendidas e aprendidas e que, assim, possam ser disseminadas espontaneamente entre a própria comunidade e regiões vizinhas. É característico das tecnologias sociais esta natureza propagadora.
Por essas razões, a tecnologia social precisa ser altamente customizável, ou seja, adaptável, maleável a cada realidade encontrada. E é por isso também que a participação genuína e efetiva da comunidade na construção e execução das soluções têm trazido resultados tão impressionantes e inspiradores.
Na Fundação Vale, temos alguns exemplos de aplicação de tecnologias sociais. Entre eles, podemos destacar o Casa Saudável, um projeto de promoção da saúde em parceria com o Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento (CPCD), que se propõe a disponibilizar o acesso a fontes de água e de alimentos e a instalações sanitárias, com a implantação de tecnologias sociais simples e de fácil replicação, construídas pelos próprios moradores após participação em oficinas teóricas e práticas, sob orientação de educadores sociais experientes e sensíveis.
No Maranhão, Alto Alegre do Pindaré, Açailândia, Buriticupu e São Pedro da Água Branca, assim como muitas cidades do interior do estado, têm uma baixa percentagem da população atendida por saneamento básico. Boa parte das famílias não têm banheiro em casa, nem destinação apropriada para dejetos. Eles acabam sendo depositados ao ar livre e contaminam o solo. Algumas famílias constroem fossas rudimentares, sem uma técnica adequada, que contribuem para a contaminação dos lençóis freáticos.
No Casa Saudável, é implantado um banheiro seco compostável externo, uma caixa-reservatório (cisterna) de 16 mil litros para captação de água das chuvas, cuja finalidade é o consumo humano, e uma horta familiar permacultural para produção de alimentos. É importante destacar que todo este processo acontece com intenso engajamento comunitário, em uma busca coletiva pela melhoria na qualidade de vida, da redução da vulnerabilidade e dos riscos à saúde, e de cuidados com o meio ambiente.
A horta familiar, na forma de mandala, além de ser uma fonte de renda para as famílias beneficiadas, permite que a comercialização dos excedentes da produção de gêneros alimentícios contribua para maior qualidade de vida, com a adoção de hábitos alimentares mais saudáveis.
Na Fundação, nós aprendemos - e continuamos a aprender - muito com o Casa Saudável, que já envolveu mais de 350 famílias desde 2014. Aprendemos principalmente que algumas tecnologias sociais, por mais simples que apareçam - não podem ser desprezadas e descartadas. E que com o envolvimento real das pessoas beneficiadas, pressuposto no conceito de tecnologia social, o potencial transformador surpreende.